segunda-feira, 21 de setembro de 2009

O pipi do cachorro

§ Hoje eu chorei pensando na minha vida. Pensando nos meus problemas, nas decisões que eu tenho que fazer. Pensando nos rumos que eu vou tomar. Acho que é a primeira vez que eu não tenho a menor noção de como estará a minha vida em um prazo curtíssimo de tempo. Eu não tenho idéia do que fazer em janeiro, do que vai acontecer, em qual cidade estarei morando. E essa não previsão do futuro está me afligindo.
§ Enquanto eu chorava refletia também que há muitas pessoas com problemas piores que os meus. Para muita gente, aliás, os meus problemas seriam nada. Talvez até eu esteja dramatizando demais. Pior seria ter uma doença grave, como câncer, ou sofrer um acidente e ficar paralítica. Ou que isso acontecesse com meus pais ou meus amigos, ou pior ainda, ter um filho e ver essas mazelas ocorrendo a eles. Ou ter uma família pra sustentar e perder o emprego, entre outras coisas, que são dramáticas de verdade.
§ Por conta dessas reflexões e desses choros eu decidi ir ao trabalho caminhando pela praia. Além de ser mais rápido, é uma forma de ver a natureza e agradecer a Deus pelas maravilhas que ele criou, em vez de ficar resmungando. Só que o problema é que hoje estava chovendo um pouco e ventando. Quando não chove, já venta bastante na praia, bem mais que na Nossa Senhora e na Barata, porque os prédios nos protegem, é óbvio. Então, antes mesmo de chegar à praia, eu sabia que estaria ventando bastante, mas decidi ir por lá mesmo.
§ Pois bem, o vento estava tão forte que mal cheguei à Atlântica e ele entortou a armação do meu guarda-chuva. Isso mesmo, não é que tenha simplesmente virado, ele entortou aqueles ferrinhos de sustentação e eu acabei ficando sem o guarda-chuva. Fui o caminho todo na chuva e contra o vento forte. Lembrei então de um episódio do Chaves, no qual dá tudo errado pro professor Girafales. A dona Florinda termina com ele e várias tragédias acontecem depois. Alguém chega e fala que só faltava um cachorro fazer xixi nele. E aí no final ele aparece com as calças sujas de xixi de cachorro.
§ Como eu já falei, com certeza existem coisas piores acontecendo, pessoas enfrentando situações bem mais difíceis que a minha. Mesmo assim eu estava me sentindo acabada, derrotada, deprimida. E o guarda-chuva entortado foi para mim como o pipi do cachorro para o professor Girafales...

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Bienvenido a Chile - Parte 2


§ O Chile sofreu com uma das ditaduras mais sangrentas da América Latina. Conversando com a Andrea, dona da pousada na qual me hospedei em Pucón, a mesma começou a falar do quanto admirava os brasileiros, que nós éramos e estávamos sempre alegres, sem importar o que acontecesse. Para ela, os chilenos eram sérios, carrancudos, tristes demais. Eu e o FH, um dos brasileiros do mochileiros.com que estava comigo em Pucón, confabulamos se talvez a ditadura, que como eu mencionei, foi uma das mais sangrentas da América Latina, não os tivesse deixado assim. Ela contou que pode até ter acentuado essas características, mas que eles sempre foram assim, meio tristes.

§ Eu lembrei então que uma vez o Neruda, ele próprio chileno, escreveu que a geografia de um país reflete bastante as características e espírito de seu povo. E o Chile é assim: estreito entre a cordilheira e o mar, aliás a cordilheira parece querer empurrá-lo para o mar, cheio de falhas geológicas, de catástrofes causadas por terremotos e vulcões. O Chile é um país ferido geológica e geograficamente, e ao que parece, seu povo também...

§ Há um outro motivo para essa "tristeza" chilena: o clima, que geralmente é frio. Deve haver pesquisas que comprovem isso, mas mesmo sem citá-las podemos chegar à conclusão de que as pessoas de lugares muito frios são mais sérias e reservadas que as de lugares quentes. Pessoas que vivem em países tropicais, mesmo que pobres, parecem ser mais felizes do que as que vivem em países frios. Exemplo disso somos nós, os latinos, super calorosos. A Andrea falou que no norte do Chile, que é mais quente, as pessoas são mais alegres e calorosas, o que eu pude comprovar quando estive lá. À medida que se vai descendo pelo país, o povo se torna mais reservado.

§ Isso me fez pensar em mim mesma. Sempre odiei o calor e amo tempo frio. E por mais que as pessoas achem o contrário, sou "interiormente" falando, fria. Nunca fui muito de abraçar e beijar e sair falando com todo mundo, nunca tive essa brasilianidade, essa alegria excessiva. Acho que agora até melhorei; depois que comecei a mochilar na América Latina me tornei mais latina. Estou mais alegre, de vez em quando até gosto de dias com sol (mas que sejam frios ou no máximo frescos, quentes não!!) e não tenho mais manifestado tanto aquela personalidade introspectiva e depressiva que eu sempre costumei ter... Tá bom, esse post não é sobre mim!
§ Voltando a falar do povo, a Andrea também nos contou sobre a rixa que existe entre os chilenos e os argentinos (aliás, os argentinos têm rixa com TODOS os países sul-americanos). Eu preciso estudar mais História, porque não sei se foi uma guerra ou uma simples disputa, só sei que a Andrea falou que (há muito tempo) o Chile cedeu uma parte da Patagônia aos argentinos, que hoje faz parte da Patagônia argentina. Mesmo assim, nuestros hermanos cismam em afirmar que os chilenos estão doidos pra invadir a patagônia deles (como se sempre houvesse sido deles). Eu mesma lembro de já ter lido inúmeros comentários assim nos sites do La Nación e do Clarín. Coisas do tipo, como o mar está subindo e eles não têm muitas terras, estão se rearmando para nos invadir e nos fazer colônia deles. É pra rir né.... os argentinos são muito histéricos, mas isso também é assunto pra outro texto.
§ Aproveitando que eu já citei Pucón, vou escrever um pouquinho acerca dessa cidadezinha. Ela é minúscula, tem uma avenida principal e algumas ruas que a cruzam. Em qualquer ponto da cidade onde você se hospede, estará bem localizado. Pucón está às margens do lago Villarrica, próxima ao lindo e ativo vulcão que leva o mesmo nome do lago. Assim que eu cheguei à pousada, vi na porta uma mensagem que dizia para não dar comida aos cachorros na rua. Como eu tenho medo de cachorros, nem me atreveria mesmo a fazer isso. Muito bem, foi só eu sair pra dar umas voltinhas que os cachorros começaram a me seguir. Cara, os cachorros da cidade reconhecem os turistas, e como eu fui em uma época de baixa temporada (o lugar tava praticamente vazio), não tinha muita gente pros bichanos seguirem. Aí já viu né... eu passei três dias lá e nos três dias TODOS os cachorros da cidade me seguiram. Isso mesmo, TODOS. Às vezes eu entrava nos mercados, nas lojas e ficava uns minutos lá pra ver se os bichos sumiam, mas era só colocar o primeiro pé pra fora que eles reapareciam e me seguiam novamente.
§ Eles também ficavam atrás do Murilo e do FH, que estavam comigo, mas o alvo principal era eu. Eles só iam pras bandas dos meninos quando não conseguiam espaço perto de mim (eram uns 10). Eu acredito que deve ter sido porque eu tava sempre comendo alguma besteira, algum doce, e colocava o papel e a embalagem nos bolsos. Eles deviam sentir o cheiro e por isso ficavam me seguindo, só pode! O mais engraçado é que no meu último dia lá eles estavam atacados. Então de vez em quando tentavam atacar alguém na rua. E as pessoas me xingavam, achando que os cães eram meus. Logo eu, que tenho tanto medo de cachorro...

Bienvenido a Chile


§ Chile, provavelmente o primeiro país latino-americano a ingressar no chamado primeiro mundo. Eles ainda têm muitos problemas para resolver, ainda têm muita pobreza e desigualdade também, mas com certeza estão melhores que nós e quase todos os nuestros hermanos de continente.


§ Este país estreito e fino tem uma vantagem: uma pequena população. Convenhamos que é muito mais fácil "cuidar" de 16 milhões de pessoas que de 190 milhões, como no nosso caso. Só que esse não é o único motivo do desenvolvimento chileno. Há vários, eu não sei todos e de qualquer maneira, o desenvolvimento deles não é o motivo d'eu estar escrevendo este post. Eu só quero mesmo falar um pouco do que eu vi e vivi no Chile, das minhas impressões acerca desse país encantador.


§ Eu já tinha passado rapidamente pelo norte do país em um outro mochilão que fiz, porém foi bem rápido mesmo. Eu precisava voltar ao Chile para conhecê-lo melhor. Eu precisava voltar à terra e palco das narrações da Isabel Allende, que eu tanto gosto. Aliás, acho que foi por causa da Allende que eu passei a gostar do Chile.


§ O primeiro contato com o país é na imigração / aduana: a deles é bem demorada, os funcionários de fato checam tudo, você não pode entrar nem com frutas (eles alegam que é para não levar pragas e nem "roubar" espécies locais). Não que eu tenha viajado por muitos países desse mundão, mas dos poucos que eu conheço, o Chile é o que tem uma das imigrações mais demoradas. Ou seja, já dá uma impressão de "país sério" de primeira.


§ Nessa minha última viagem, cruzei a fronta pela importante rota (que apesar de ser importante, não lembro o nome agora) que liga Mendoza (Argentina) ao país, e que é quase uma linha reta que vai direto a Santiago. Eis então a primeira coisa que me chamou a atenção no: a quantidade de pedágios! Já dentro de Santiago - penso eu, pelo menos - nós passamos por uns 4. Em uns 40 minutos no máximo. Toda hora eu achava que já estávamos chegando à rodoviária e então aparecia mais um pedágio. Depois, conversando com locais, fiquei sabendo que no Chile há mesmo pedágios para sair e entrar nas cidades. E no caso de Santiago, a maior cidade do país (e a única grande "de verdade"), pagar pedágio também é necessário para passar de um bairro a outro, em alguns casos. Por falar em excesso de pedágios, no Chile, como também na maior parte dos países do primeiro mundo, o ensino superior é privado.


§ Andando nas ruas santiaguinas, a segunda coisa que me chamou a atenção foi o fato de os adolescentes se vestirem de maneira muita parecida aos adolescentes japoneses. Sabe aquelas roupas de colegiais e aqueles cortes de cabelo estilosos que a gente vê no Japão? Então, os adolescentes chilenos são praticamente a mesma coisa, só que com olhos menos puxados. É até engraçado, porque por volta de 90% da população é mestiça, ou seja, os chilenos se formaram basicamente da união dos brancos (europeus) com os índios, então a maior parte deles tem a pele branca ou morena clara, os cabelos escuros, geralmente lisos, e aqueles olhos e nariz típicos dos mapoches e incas. Ou seja 2, eles até lembram um pouquinho fisicamente os orientais, deve ter sido por isso que eu os achei parecidos, além da indumentária e do corte de cabelo. Tentei ficar buscando um motivo a mais para semelhança, e com essa coisa de Tratado do Pacífico e acordos de livre comércio que os dois países têm, acho que os japinhas acabaram influenciando mesmo os chilenos. Depois uns outros brasileiros me falaram que os adolescentes também lembravam aquele povo do rebeldes, observação essa que se encaixa muito bem.


§ Por falar em brasileiros, tá aí uma outra coisa que me chamou a atenção: nem em BsAs e em toda Argentina, se duvidar nem em todo o Brasil, eu vi tanto brasileiro como no Chile! Deus meu... acho que estamos descobrindo agora esse país e todo mundo decidiu ir pra lá junto. No meu albergue só tinha brasileiro, em todos os lugares que eu visitei eu só encontrei brasileiro, eu caminhava pelas ruas e só escutava português. Fora o grupo maravilhoso de brasileiros que eu conheci no mochileiros.com e encontrei lá, mas isso é assunto pra outro post.


§ Eu queria bastante conhecer Valparaíso. Além de ser a cidade onde Neruda viveu a maior parte de sua vida, foi também o cenário de muitas das histórias da Allende. E lá fui eu doida pra ver a San Francisco do Pacífico Sul. Achei a cidade um pouco suja e abandonada, deu uma leve pontinha de tristeza. Mas depois de subir o primeiro cerro minha imaginação me levou às histórias que eu tinha lido tantas vezes, e me fez pensar e criar outras. Valparaíso é hoje uma cidade basicamente portuária e o turismo acabou se voltando mais para Viña del Mar, Reñaca e outras praias próximas, o que explicaria o "abandono". Mesmo assim, pretendo voltar lá, e poder caminhar mais devagar pelos cerros, apreciando cada pontinho, cada casinha, cada paralelepípedo, cada detalhe que compõe a essência do lugar.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Só sei que eu não sei mais...

§ Eu não sei mais. Cresci aprendendo que algumas coisas eram certas e outras erradas. Durante esse crescimento aprendi que algumas coisas que me disseram ser erradas não eram erradas e que algumas certas, também não eram necessariamente certas. Na verdade, quase tudo depende de vários fatores, mas eu, talvez até erradamente, acredito que a criação dos pais (e os valores de moral e costume que eles nos passam) e a religião são os que mais nos influenciam a julgar o que é certo e o que é errado.
§ Por exemplo, para uma pessoa não religiosa, fazer sexo antes do casamento não é errado; já para um católico praticante ou um evangélico é. Em muitas igrejas evangélicas diz-se que beber (bebidas alcóolicas) é errado, mas eu mesma já ouvi um pastor falar que "isso não é pecado" e que a bíblia diz que o errado é se embriagar, ou seja, beber em excesso e ficar bêbado.
§ Então, quase tudo parece ser relativo. E é nesse quase tudo que entram os meus questionamentos... Como já explicitei, o que é certo para um pode ser errado para o outro, depende do referencial. Mas a despeito das nossas crenças, existe a Lei. Sim, a Lei é passível de mudanças, ela não é a verdade absoluta. Porém ela tem que ser seguida. Eu pelo menos acreditava nisso, era isso que eu sabia.
§ Não vou discutir aqui se a maconha deve ou não ser legalizada, apesar de ter minha opinião acerca do assunto, mas sim o fato de que ela ainda não é legalizada. E por conta disso, consumi-la agora é errado. Mesmo assim, por que tantas pessoas consomem essa droga e agem como se fosse a coisa mais normal do mundo? Por que as pessoas, logo depois de consumi-la, começam a reclamar de políticos que não estão agindo em conformidade à lei, quando elas mesmas não estão?
§ Antigamente eu achava bem distante essa coisa de "pessoas que usam maconha". Depois conheci umas pessoas que usavam, mas elas eram só conhecidas, colegas. Nenhum amigo meu usava e eu até achava que esse era um dos motivos de serem meus amigos. Pois agora até alguns amigos meus a usam; amigos que até pouco tempo pensavam como eu, que também se revoltavam com a glamourização que davam a esse ato ilícito.
§ E agora não sei mais... Será que tenho mesmo que rever os meus conceitos (em todos os sentidos, desde a maconha como algo ilícito até o fato de continuar andando com amigos que têm opiniões tão divergentes das minhas). Eu não sei mais...